terça-feira, 22 de janeiro de 2008

noite 0




Noite escura.
Noite áspera.
Noite à noite.
Frio no corpo com o quarto em silêncio.
Ouves?

Tenho os olhos cansados, de corpos ausentes, etéreos. Deixei o corpo dormir de mim e voltar ao ponto de partida onde os dias definam e os odores apestam nas calçadas das cidades que resolvi abandonar em prol de um dia sem ti. Não te vi, nunca te vi, não conheço o meu nome no teu sorriso. Nunca adormeci com os teus lábios nos meus ouvidos. O meu corpo foi, veio... e foi, no calor da lã do casaco que nunca usas-te... sempre odiamos os chapéus de chuva e o frio insistia em beijar-me os pés.
Não sorrias.
Não preciso do teu sorriso na noite das noites.
Tinha a cabeça na copa das árvores no dia em que passavas junto às minhas mãos, desculpa, não te vi... procurava ninhos nas árvores que povoavam de seres as nossas noites, as que nunca tivemos, as que sempre vi no estalido da manhã azul. Soltei-o mais uma vez, no interior dos sonhos abandonados de mim e onde os pássaros nos comiam a pele, lambiam o odor a sémen amarelecido da volúpia das horas abandonadas.Não perdi o sabor a ti mas vendi a tua memória nas noites usadas.
Noite de noite com a lua a estalar nos meus ouvidos e os gritos a pesar nas costas. Larguei os braços e as pálpebras enchem-se de pó, de sono, de pesadelos, de incensos pintados com o teu cabelo.
Soltem-se os gritos. Soltem-se os braços. Soltem-se as luas que continuam a povoar as minhas noites, na casa azul e no branco das paredes que abraçam o pescoço que espera o teu teu sorriso antes que anoiteça. Antes do fechar dos dias. Antes do ir à rua e cruzar-me com o teu corpo abandonado. Uma vez mais. Ouves?

Um comentário:

Anônimo disse...

Suponho que estejamos sempre à espera de quem nunca vimos e cujo o nome ignoramos, mas já tantas vezes larguei essa busca só para a retomar de seguida...
Adoro o facto de pôres tanto de ti nos teus textos. Nem todos têm coragem de assumir o vazio.